«Fumar, fumar! A tanto me resumo
A fumar e a fumar o tempo arrasto.
Que longe o mundo está, o mundo vasto!
Fumar, fumar! O meu bordão é fumo.
Ir para o Norte ou Sul? Perdi o rumo.
De tanto já sofrer me sinto gasto.
Dum fogo inapagável sou o pasto,
Sem que me mate, nele me consumo.
A tudo quanto sou eu digo adeus.
Adeus à Fé, à Esperança! Ao próprio Deus?
Se houvesse um Deus consentiria nisto?!
Ou será que o seu querer impenetrado,
para cumprir-se o nunca revelado,
me entregou maior cruz do que a de Cristo?»
Douda Correria#129
Sonetos da Casa Amarela – Tomaz de Figueiredo
(prefácio de Catarina Mourão/ colagens de Raquel Pedro/ composição por Joana Pires)
Imprensa/ Blog´s
Blog Antologia do Esquecimento | por Henrique Manuel Bento Fialho | 10.01.2021
http://universosdesfeitos-insonia.blogspot.com/2021/01/sonetos-da-casa-amarela.html
Tomaz de Figueiredo (1902-1970)
Nascido “acidentalmente” em Braga, como costumava dizer, Tomaz de
Figueiredo viveu desde tenra idade em Arcos de Valdevez (“terra minha
pela memória e pelo amor”), na casa construída pelo seu avô materno, a
Casa de Casares, onde viveu “muito da sua vida vivida e outro tanto da sua
vida imaginada”. Essa velha casa de campo serviu-lhe de inspiração para
“A Toca do Lobo”, o seu romance mais conhecido, publicado em 1947 e
vencedor do prémio Eça de Queiroz. É um livro de memórias, onde a
saudade está obsessivamente presente, revisitando locais do passado e
familiares já desaparecidos.
Apaixonado pela sua língua materna, Tomaz de Figueiredo é um escritor
multifacetado. Mais conhecido pelos seus romances, o seu labor literário
não se esgotou na prosa, tendo praticado todos os géneros literários
incluindo a poesia e o teatro. A sua escrita vernacular é carregada de
expressões populares e de descrições vivas e sentimentais. Tomaz de
Figueiredo foi, no dizer do crítico João Bigotte Chorão, “um escritor, um
cavador de palavras, um servidor do idioma”.
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